O que causa as cáries nos dentes?
Escrito por: Dra. Viviani N. Tonon (CRO/SP 00000)
A cárie não “aparece do nada”. Ela é o resultado de uma combinação de fatores: bactérias, açúcar, tempo e falta de proteção. Quando esses elementos se somam, o esmalte do dente começa a se desgastar de forma silenciosa, até que um dia a dor aparece. Meu objetivo aqui é explicar, em linguagem simples, como esse processo acontece e o que você pode fazer para interrompê-lo.
Placa bacteriana: o ponto de partida
A nossa boca é naturalmente cheia de bactérias. Isso é normal. O problema começa quando essas bactérias se organizam em uma camada pegajosa sobre os dentes, chamada placa bacteriana. Ela se forma todos os dias, especialmente depois que comemos.
Quando a placa não é removida corretamente com escovação e fio dental, ela se acumula próximo à gengiva e nas superfícies onde a escova não alcança bem, como entre os dentes e em sulcos de molares. É dentro dessa placa que o processo de cárie se desenvolve.
Açúcar e amido: o “combustível” da cárie
As bactérias da placa adoram açúcares e carboidratos fermentáveis, como doces, refrigerantes, sucos adoçados, biscoitos, pães, massas e snacks em geral.
Quando você consome esses alimentos, as bactérias usam o açúcar como alimento e produzem ácidos como resultado. Esses ácidos atacam o esmalte do dente, tirando minerais da superfície (processo chamado de desmineralização).
O problema não é só o que você come, mas quantas vezes por dia você come. “Beliscar” o tempo todo, tomando café com açúcar, biscoitinho, docinho, refrigerante, faz com que o dente fique sob ataque ácido várias vezes ao dia, sem tempo de se recuperar.
Tempo de exposição: o dente não descansa
Cada vez que você ingere algo açucarado, o pH da boca cai e fica ácido por cerca de 20 a 40 minutos. Se você faz muitos lanches ao longo do dia, esse tempo se soma, deixando os dentes praticamente o dia todo expostos aos ácidos produzidos pela placa.
Se, além disso, a higiene não está adequada, a placa fica mais espessa e resistente, favorecendo ainda mais a desmineralização do esmalte.
Defesas naturais: saliva e flúor
Felizmente, o organismo não fica de braços cruzados. A saliva ajuda a neutralizar os ácidos e a repor minerais no esmalte. Já o flúor presente em cremes dentais e em alguns enxaguantes fortalece o dente e torna o esmalte mais resistente ao ataque das bactérias.
Quando a pessoa tem pouca produção de saliva (boca seca), usa medicações que reduzem o fluxo salivar ou não utiliza creme dental com flúor, a balança pende ainda mais para o lado da cárie.
Por que algumas pessoas têm mais cáries que outras?
A cárie não depende apenas de “escovar bem ou mal”. Existe um equilíbrio entre fatores que favorecem a doença e fatores que protegem o dente. Entre os principais pontos que aumentam o risco de cárie, estão:
- higiene bucal insuficiente ou apressada;
- não usar fio dental diariamente;
- muitos lanches açucarados ao longo do dia;
- consumo frequente de refrigerantes, sucos adoçados e bebidas esportivas;
- baixa produção de saliva (boca seca);
- uso irregular de creme dental com flúor;
- histórico de muitas cáries no passado;
- restaurações antigas infiltradas, que acumulam placa.
Por outro lado, pessoas que mantêm boa higiene, usam flúor corretamente, têm alimentação mais equilibrada e fazem consultas regulares tendem a desenvolver bem menos cáries ao longo da vida.
“Eu escovo todo dia. Por que mesmo assim tive cárie?”
Essa é uma dúvida muito comum no consultório. E a resposta quase sempre envolve detalhes:
- escovação muito rápida, de menos de 2 minutos;
- áreas esquecidas, como parte de dentro dos dentes inferiores ou região do último molar;
- fio dental usado apenas “de vez em quando”;
- escova desgastada, que já não limpa adequadamente;
- muitos “beliscos” ao longo do dia, mesmo com escovação depois das grandes refeições.
Ou seja: não é só escovar, mas escovar com técnica, tempo suficiente e associar ao fio dental e a bons hábitos alimentares.
Primeiros sinais de cárie: o que observar?
A cárie no início geralmente não dói. Alguns sinais podem indicar problema em fase inicial:
- mancha branca opaca em uma região do dente, principalmente próximo à gengiva;
- pequena cavidade ou “buraquinho” onde o fio dental enrosca;
- sensibilidade leve ao frio ou ao doce em um ponto específico;
- alimento que sempre prende no mesmo local.
Nessa fase, o tratamento é bem mais simples e conservador. Por isso, as consultas de rotina são tão importantes: muitas cáries iniciais só são detectadas pelo dentista, com boa luz e instrumentos adequados.
Dúvidas frequentes sobre causas de cárie
Cárie é só por causa de açúcar?
O açúcar tem um papel central, mas ele não age sozinho. Sem placa bacteriana acumulada, o risco é menor. Sem tempo suficiente de contato com o dente, o ataque ácido é reduzido. Sem fragilidade do esmalte, o dano é menor. Por isso falamos de equilíbrio: cárie é o resultado da soma de fatores, e não de um único culpado isolado.
Se eu escovo os dentes todo dia, por que ainda tenho cárie?
Porque detalhes fazem muita diferença: o tempo que você dedica, se alcança todas as superfícies, se usa fio dental, se troca a escova no tempo certo e quantas vezes por dia consome alimentos açucarados. Às vezes, pequenos ajustes na rotina já reduzem bastante o aparecimento de novas cáries.
Cárie passa de uma pessoa para outra?
As bactérias associadas à cárie podem ser transmitidas, sim, principalmente de adulto para criança, ao assoprar comida, experimentar a papinha com a mesma colher ou compartilhar copos e talheres. Isso não significa que a doença “passa” automaticamente, mas aumenta a chance de a criança ter um ambiente bucal mais propenso à cárie, principalmente se a higiene não for adequada.
Enxaguante bucal sozinho evita cárie?
Não. O enxaguante pode ajudar em situações específicas, mas não substitui a escovação nem o fio dental. A placa bacteriana precisa ser removida mecanicamente, esfregando dente por dente. Pense no enxaguante como um aliado, não como o protagonista do cuidado diário.